Um pouco mais cedo, por volta de 19h, Rainen chegava à casa dos Andrade. E eles sabiam, pois era inconfundível o barulho daquele motor.
Ele
ainda manobrava e Renata já o aguardava à porta. Em seguida, apareceram Mario e
Elizabeth. Rainen caminhou na direção do grupo e Mario se impressionou ao ver o
rapaz:
—
Meu Deus, o que eles te deram no exército? Bomba? — feliz, o cumprimentou.
—
Ouvi dizer que é algo colocado na água. — Rainen sorriu.
—
Ah, sim, da casa de um pastor de árvores[1].
— Eu
entendi a referência — Renata riu.
— Li os livros ainda no primeiro grau.
—
Rainen, não precisa me dizer mais nada. Elizabeth, liga pro padre Firmino, pergunte
se ele pode vir celebrar um casamento às pressas.
Todos
gargalharam.
—
Pai! — Renata foi do contra.
—
Foi só uma brincadeira e, no mais, gostei de saber que seu namorado aprecia a
leitura.
— Só
me falta tempo.
—
Entendo. Mas vamos entrando — convidou Elizabeth.
Lá
dentro, a mesa estava posta com as porções de alimento ainda fumegando.
—
Renata, chame a sua irmã, por favor.
—
Não precisa, já estou descendo — falou fechando a porta do quarto. — Afinal,
com todos os cuidados que vocês tiveram na preparação desse jantar, eu não
poderia perder.
E
Bruna desceu a escada. Trajava um vestido tubinho azul, que lhe caía muito bem.
Rainen percebeu algo.
“Parece
um pouco mais magra”, pensou, pois, mesmo sendo intragável, era tão bela quanto
Renata, e isso representaria um problema, deixando-o desarmado e acessível. Ele
sabia que um ledo engano, um olhar falho ou a troca de nomes e Bruna seria ela
mesma: irritante e grossa. Contudo observou que a garota estava um pouco
diferente, talvez desgastada.
—
Boa noite! — ele se limitou em dizer.
—
Boa — ela respondeu, fria.
Para
piorar, na hora de se sentarem à mesa, Bruna e Renata ficaram lado a lado,
ficando de frente para Rainen. Difícil não olhar para as duas e compará-las. A
semelhança sempre o espantou.
“Como
pode? Duas mulheres tão lindas, uma é boa e a outra ruim.”
Fato
é que, para ele, foram momentos tensos durante o jantar. Não tinha vontade de
falar nada, e quando era perguntado sobre algo, respondia da forma mais curta
possível. Até a comida, saborosa como parecia, lhe era como serragem na boca.
Bruna
não lhe dirigiu o olhar, que dirá a palavra. Tinha uma vontade:
“Queria
mesmo que ele engasgasse com a comida.”
E
não é que o pedido lhe foi atendido? Muitos pensamentos, um pedaço de frango
mais seco, um gole de água, e a situação estava armada. A carne não descia e
travou em sua garganta, com isso, o ar deixou de passar e se asfixiava, sem
conseguir falar. Bruna se debateu e os parentes não sabiam o que acontecia.
Rápido, Rainen deu a volta na mesa, colocou a garota de pé e retirou a cadeira.
Com a parte inferior do punho, aplicou três golpes fortes e separados cerca de
um palmo abaixo da nuca. Não resolveu e Bruna começava a mudar de cor. Vendo a
ineficiência do movimento, ele tentou outra coisa. A garota sentiu os braços de
Rainen a pegarem no abdômen e iniciar uma sequência de compressões. Na quarta
tentativa, o pedaço de carne foi expelido.
Fragilizada
com o incidente, Bruna permaneceu segura por Rainen. Ele a suspendeu,
verificando que respirava normalmente e que a cor voltava ao normal. Naquele
momento, os pais tentavam se acalmar:
—
Senhor! Senhor!
—
Foi por pouco. Não sei como te agradecer — Elizabeth estava emocionada.
— O
pior já passou — Renata limpava a irmã com um guardanapo.
—
Vamos levá-la ao quarto. Precisa de repouso.
Ele
a ergueu no colo e subiu as escadas acompanhado pelos familiares. Renata passou
à frente abrindo a porta e, com cuidado, ele a colocou sobre o colchão.
—
Vou ligar para o Sandro.
— É
o melhor a fazer.
Enquanto
isso, Rainen desceu e aguardou no sofá da sala. Se a sensação estava ruim
antes, agora era asfixiante. Após alguns minutos, o médico chegou e fez uma
análise da garota. Ainda no quarto dela, Sandro os informou:
—
Ela está bem. A ação rápida do rapaz permitiu que não passasse de um susto.
Bruna
estava acordada e ouvir aquelas palavras a feriram no orgulho.
—
Recomendo que faça um check-up só
para verificação, mas está tudo bem.
Assim
que o grupo desceu, Bruna correu para o banheiro, retirando as vestes.
“Ele
me tocou, ele me tocou! Vou queimar essas roupas.”
Mas,
quando ficou nua diante do espelho, sentiu algo quente em torno do seu abdômen,
além de uma fragrância que ela pouco conhecia.
—
Maldiç…
Na
sala, o grupo ouviu as instruções do médico, que agora se despedia.
—
Passar bem.
—
Obrigado, Sandro.
—
Também preciso ir — Rainen se aproveitou da saída do médico.
—
Mas nem terminamos o jantar — pontuou Elizabeth.
—
Fica para outro dia — respondia sob os olhos protestosos de Renata, que
desejava a sua permanência. — No mais, amanhã cedo eu preciso ir buscar peças
na cidade aqui ao lado. Então pretendo acordar ce…
—
Posso ir com você? — Renata mal aguardou o fim da frase.
—
Claro! — E olhou para Mario e Elizabeth, que confirmaram em silêncio. —
Sairemos às 8 horas.
—
Você é uma pessoa honrada, Rainen — disse Elizabeth. — Sou grata por nossa
família tê-lo conhecido.
Ele
corou ouvindo as palavras.
—
Bom, gente. Preciso ir. Até breve!
E
Renata o acompanhou até a caminhonete. Ali insistiu mais um pouco.
—
Queria tanto que você ficasse.
O
rapaz a puxou e a beijou longamente. Suas mãos percorriam do tórax até o cabelo
de Rainen.
— Eu
te amo!
Ela
disse antes de mergulhar em outro beijo apaixonado e, dessa vez, de forma
discreta, colocar a sua mão sobre o membro do namorado.
—
Amanhã passaremos bastante tempo juntos, tudo bem?
—
Quase não me aguento de saudade.
—
Mas estivemos juntos ontem.
—
Pra mim é muito tempo. — Ela fez uma pausa. — Desde que você entrou aqui em
casa, eu estou lubrificando.
E
mais beijos.
—
Tenta se controlar um pouco.
—
Não dá. Isso está no automático.
Rainen
riu.
—
Desculpe! — pediu diante da seriedade da moça.
Ela
ignorou e o beijou. Em poucos minutos, ele entrou na caminhonete, deu partida e
saiu lentamente. Da janela do quarto, Bruna assistiu toda a cena. Ela segurava
nas mãos, a roupa que tinha usado aquela noite.
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