Eram 17h42 daquela quinta-feira. As transações financeiras não
davam indicativo de que diminuiriam nem em volume nem em valores. Em meio à rotina
caótica, raciocinou:
“Isso não está certo.”
Então o telefone tocou.
— Andarate Representações, boa tarde — ela atendeu, mecanicamente.
— Boa tarde! A senhorita Renata.
— É ela quem está falando. Quem fala?
— Pensei que me reconheceria pela voz.
Uma breve pausa, até que ela respondeu:
— Rainen?!
— Sou eu, amor.
— Desculpe, é que o volume de trabalho aqui é altíssimo.
— Disso eu tenho certeza — comentou impressionado.
— Está tudo bem? Estou com saudades. — Ela tentava se
reestabilizar após a forte emoção.
— Melhor agora que ouço a sua voz. Esses dois meses foram cruéis
longe de você.
— Nem quero falar sobre isso, senão eu abandono tudo aqui e corro
até você. — Riram e ela mudou de assunto: — E como vão as coisas?
— É sobre isso que quero falar. Fui liberado do período de
internato, saio às 17 horas. De lá, vou para o Tony e fico das 18 horas às 22
horas. Só para avisar.
A notícia a deixou muda do outro lado da linha.
— Renata? Alô?!
— Oi… oi… ainda estou aqui.
— Ah, bem, talvez esteja ocupada. Não quero atrapalhar. Liguei só
para avisar mesmo.
A garota teve certa dificuldade em responder, já que pensamentos
inoportunos a incomodavam.
— Ok. Tudo bem. Obrigada!
— Você está estranha.
— Tem muito serviço aqui — justificou.
— Tudo bem, eu vo…
— Posso te ligar amanhã de manhã? — ela o interrompeu.
— Pode, claro. É o mesmo prefixo que te passei, só muda o final,
que é 3434.
— Ok! Beijos e até mais. — E desligou.
Terminada a ligação, ele foi para a parada de ônibus e, de lá,
para a oficina. Sua jornada estava longe de acabar.
Quando Renata colocou o telefone no gancho, o caos se instaurou em
seu ser. A voz de Rainen a levou para um mundo de sonhos e desejos, algo
emocional, sensível e, ao mesmo tempo, cruel. Mesmo com a realidade lhe
chamando, através de ligações que se acumulavam, ela suspirou.
“Preciso de água.”
Mera estratégia para se acalmar. Levantou-se e foi ao bebedouro.
De lá voltou mais estável, mais contida, e assim permaneceu até terminar o
serviço e retornar para casa. Foi só ali, na mesa de jantar, diante da conversa
animada de seus pais, que ela disse mais alguma coisa:
— Rainen me ligou. — Segurou o sorriso.
Seus pais olharam para ela, dando-lhe atenção:
— Que bom, filha. E o que ele contou? — perguntou Elizabeth.
— Que está liberado do período de internato — respondeu serena.
— Esse é um rapaz de fibra, de garra.
— Não sei se estou enganada, mas você parece muito empolgado
quando fala dele.
— Eu não. — Ele sorriu e piscou para a esposa.
Renata percebeu.
— E o que intenta, filha?
— Quero sair com ele no sábado e vê-lo no domingo.
Mario servia a sobremesa para as duas.
— Me parece saudável. — Elizabeth olhou séria para ele. — E o que
pretendem fazer?
A pergunta pegou a garota de surpresa.
— Ainda não sei, talvez um cinema. No domingo, eu gostaria de almoçar
com ele, se me permitirem — disse Renata, calma e segura de si.
— Mas é claro, filha. Pode marcar.
A garota se levantou e abraçou o pai.
— Obrigada!
Ela correu pelas escadas, indo para o quarto. Ainda na mesa de
jantar, os pais conversaram:
— Acha prudente, Mario?
— Pelo que passamos com ela, acho que sim, mas precisamos criar
outros mecanismos de controle, entende?
— Concordo, mas me preocupo.
— Nós lhe demos uma boa criação, e educação, além de amor e
carinho. Agora é corrigir os pequenos deslizes e torcer para que tudo saia bem.
— Você está bem confiante, hein?!
— Claro. — Mario abraçou a esposa. — A propósito, você tem o telefone do Sandro?
— Seu malandro… — Elizabeth riu e deu um tapa no ombro do marido.
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