— Sua irmã não gosta de mim!
— Não
tem sido fácil para ela, nem para nossa família — explicou.
— Mesmo em tempos difíceis, é justificável que ela tenha tais
atitudes?
— Rainen, é claro que não! Mas considere que tínhamos uma vida
diferente dessa. — Ela fez uma pausa, recordando-se, e sorriu. — Da nossa
família, Bruna foi quem mais sentiu.
— Você é sempre tão bondosa assim? — o rapaz a olhava com profunda
admiração.
— Acho que são os seus olhos… — Renata sentiu certo acanhamento.
— Só podem ser, pois neles eu só vejo vo…
Ele foi interrompido com um safanão no braço e a voz misturada com
uma risada:
— Aê, Rainen! Mais tarde levaremos o carro lá.
Era Lendoval, um colega de turma.
— Ok! Aguardo!
— O que vocês têm aprontado por aí? — Renata perguntou, sorrindo.
— Estou trabalhando em uma oficina mecânica.
Ela sorriu e, transbordando de felicidade, o abraçou:
— Parabéns! Parabéns!
Por alguns instantes, sentiram o calor um do outro, as
fragrâncias, e a demonstração de carinho demorou mais que o esperado. Quando se
soltaram, mesmo não querendo fazê-lo, Rainen foi o primeiro a falar:
— Vou arrumar uma novidade todos os dias só para ganhar um abraço
desses.
Ela riu, respondendo:
— É certeza que ganha…
— Chega!
Nervosa, Bruna apareceu e ficou entre os dois, mas sequer olhou
para o rapaz.
— O que você está dizendo?
— Exatamente o que você ouviu. Vamos embora! — ela falou ainda
mais alto. — A van chegou!
— Preciso me despe…
— Esquece isso! — E saiu arrastando Renata pelo braço. — Quando
chegarmos em casa teremos uma conversa!
De longe, Renata acenou para Rainen, que permanecia imóvel, sem
entender direito o que aconteceu.
Durante a viagem, as duas permaneceram caladas e, ao chegarem em
casa, encontraram um bilhete na mesa da sala:
Fomos ao banco, voltaremos por volta das
16h.
—
Não podia ser melhor! — esbravejou Bruna, jogando a mochila no sofá.
— O
que você tem?
— O
que eu tenho? O que eu tenho?! Você fica de conversinha com um Zé ninguém e vem me perguntar o que eu tenho?
—
Não fale assim do Rainen.
—
Meu Deus! Já até decorou o nome dele?
— E
o que tem isso? — Renata estava na defensiva.
—
Não vou permitir que você enterre o seu futuro se relacionando com um vagabundo
daquele.
—
Você não sabe sobre o que está falando. Ele trabalha!
Cada
vez que Renata o defendia, era como se jogasse pimenta nos olhos de Bruna, que
vociferava:
— E
ele é o quê? Presidente de uma empresa? Dono de algum empreendimento?
Pouco
intimidada, Renata respondeu:
—
Mecânico! Ele é mecânico!
—
Você precisa de tratamento. Não pode estar bem da cabeça. Você arrumou um comedor de graxa?!
—
Quem precisa de ajuda é você, Bruna. Desde quando se controla o que há no
coração?
—
Que sentimentalismo é esse, Renata? Aonde isso vai te levar?
—
Espero que até algo que aumente a minha felicidade.
Bruna
riu para depois falar:
— Só
me diga como. Morando nos fundos de uma garagem? Com a mesa do café da manhã
coberta de ferramentas? Com o cheiro de gasolina entranhado em suas roupas?
— É
melhor você se calar. O que farei ou não, cabe a mim decidir.
—
Ainda não entendeu? Nós somos o futuro de nossa família. O que você vai fazer,
vivendo com aquele coitado dentro de um muquifo[1]?
Cansada
da discussão, Renata foi para a cozinha almoçar, enquanto Bruna pensava:
“Eu não permitirei que ele acabe com sua vida,
minha irmã.”
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