Ardes - Capítulo 172

 


No hospital, era dia de visita. Familiares, cônjuges, amigos… todos tentando dar atenção àqueles que passaram por algum acidente ou situação traumática. O horário permitido era das 15h até as 17h, sempre às terças, quintas e sábados. Ali, o turbilhão de emoções agia de forma diferente em cada um, mas a maioria tentava exprimir otimismo, mesmo diante do quadro mais desesperador. A família de Bruna se angustiava de uma forma mais dolorida. As irmãs, extremamente parecidas, sempre juntas, passavam a impressão de que, num futuro distante, chegariam ao fim no mesmo instante, por causa de um mesmo problema. Então aquela separação em vida partia ao meio o coração de Mario, Elizabeth, Renata e, por tabela, Rainen.

— Mas, Ronie, nos diga o que está acontecendo — implorava Mario.

— É difícil dizer. — Ronie fora indicado por Sandro para acompanhar e tratar da garota.

— Nos diga algo, por favor! — pediu Elizabeth.

— Olha, ela está inconsciente, não abre os olhos e não responde aos estímulos.

— Está dizendo que ela está em coma? É isso? — Renata se angustiava.

— Não é o que estou dizendo, mas as características são parecidas, exceto pelo fato de que vez ou outra o metabolismo cerebral dela acelera durante um tempo, depois desacelera.

— Pode ao menos…

— Não posso! — o médico interrompeu Elizabeth. — Entendo o que estão passando, mas vejam a minha situação diante do acontecido com a sua filha. Ela não teve um arranhão, não teve um osso quebrado. Ela está ali, deitada e viva. É quase um milagre. Então, convenhamos, foge um pouco da minha alçada. Peço apenas que sejam pacientes e tenham fé. Com licença.

Ronie saiu para fumar um cigarro e deixou os familiares com a paciente. O quarto em que Bruna permanecia internada era quase uma UTI[1]. Ali Ronie acompanhava os dois equipamentos, um que media o ritmo cardíaco e a respiração e outro que media os impulsos cerebrais. Mas sem alterações, se não as já citadas.

Aquele foi o terceiro dia após o acidente, e ficava evidente que a cada visita a família voltava pior para casa.

— Não há uma mudança favorável — apontava Mario.

— Ao menos não houve nada desfavorável — foi mais otimista Elizabeth.

Ouvir e ver os pais naquela condição machucava o coração de Renata, mas pior era saber que a irmã estava presa a uma cama.

— Filha, nós vamos tomar banho. Sugiro que faça o mesmo.

— Tudo bem, mãe. Eu já vou…

Nem terminou de falar e lá fora um carro estacionou, em seguida, o toque na campainha. Diante dela, o rapaz, com o braço enfaixado em dois pontos: antebraço e tríceps. Mas na outra mão trazia um caixa de bombons.

— É sério que você veio assim me ver? — Renata o abraçou, desabando em choro. — Eu te amo, eu te amo!

— Também te amo, gatinha. — E beijou sua testa.

— Entre, eu ia tomar banho. — Enxugava as lágrimas.

E a acompanhou subindo as escadas. Perto da porta do quarto ela falou alto:

— Mãe! Pai! O Rainen está aqui.

— Tudo bem, depois falamos com ele.

Renata entrou no quarto e pegou sua toalha e roupas íntimas. Em seguida, entraram no banheiro.

— Como está sua irmã?

— Ela permanece estável — respondeu à pergunta feita na porta —, e isso nos desgasta, pois fica apenas nisso.

Renata tirou a roupa e entrou no box, ligando o chuveiro.

— O médico não disse mais nada de relevante?

— O doutor Ronie disse achar estranho o fato de ela ter sintomas bem parecidos com os de um coma, mas que o metabolismo cerebral dela acelera e depois desacelera.

Desligou o chuveiro e agora se ensaboava.

— Como se tentasse funcionar?

— Eu acho! E disse que ela não tem respondido bem aos estímulos.

A mente de Rainen trabalhava as informações.

— Ela não deve estar em coma. A condição dela com certeza é outra.

— Tomara.

Renata abriu o registro, derramando água para se enxaguar.

— O médico mesmo teve o cuidado de não rotular. Acontece que, em situações como essas, os parentes querem respostas objetivas, coisa que nem sempre é fácil de dar nos primeiros momentos.

— Onde aprendeu sobre isso?

— Sou mecânico, também passo por situações parecidas, como quando um carro não tem a chave e precisamos fazer uma ligação direta para ligá-lo.

Ela agora se enxugava.

— E funciona?

— Geralmente, sim.

— Espere, deixe eu me vestir logo, antes que meus pais terminem o banho.

Ela vestiu calcinha e sutiã e, enrolada na toalha, voltou ao quarto.

— O médico está estimulando ela? — questionou Rainen.

— Sim.

— Acho que tenho uma ideia.



[1] Unidade de Tratamento Intensivo


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