Ardes - Capítulo 003


Retornava para casa após o término de suas atividades escolares, e se acostumou a passar diante da Tony Auto Atendimento, uma oficina de pequeno porte que ficava próximo de sua escola. Parava por ali e observa, à meia distância, os veículos em manutenção. Para Rainen era prazeroso. Sonhava trabalhar com aquilo algum dia, e quando o fizesse, tinha certeza de que seria feliz.

Mas, naquele dia, viu mais que a costumeira manutenção veicular. Ao longe, o dono apontava o dedo para a cara de um dos mecânicos, que permanecia imóvel. Em seguida, Tony apontou para a rua aos berros. O rapaz entrou, trocou de roupa e saiu com uma pequena bolsa, quando foi barrado pelo proprietário e demais funcionários, que o revistaram e só depois o liberaram.

A cena ficou gravada na mente de Rainen, que arrumou a mochila nas costas, e correu para casa; a fome o incomodava. Quarenta minutos depois, chegou à residência, tendo acesso pela porta da cozinha. Sem a intenção, ouviu seus pais conversando na sala:

— As coisas não vão bem na empresa e, além de diminuição de pessoal, os que ficarem terão corte nos salários.

— Meu Deus! Por que isso? — Ela sentiu-se péssima com a notícia.

— Uma firma grande quebrou e era o nosso principal cliente. — A voz de Onofre lhe era pesada.

— E sabem quem serão os demitidos?

— Estamos aguardando — respondeu, desviando o olhar. — A lista sairá a qualquer momento.

— E nós?

A pergunta era bem compreensível, pois, mesmo que a casa estivesse quitada, precisavam se manter. E como Letícia não trabalhava, era o esposo o responsável pelo sustento familiar.

— Apertar o cinto, até que as coisas melhorem.

— Quanto tempo?

Ele franziu a testa demonstrando a tensão.

— Entre dois e três anos.

— Mas e a faculdade dele? — Para a esposa, esse era o ponto principal.

— Recebendo como um segurança, eu não consigo pagar a mensalidade. A empresa tem bolsa educação para os filhos dos trabalhadores, mas, com esse momento de crise, é quase certo que suspenda.

— E como contaremos isso a ele?

— Ainda não sei. — O homem sentou-se no sofá. — Ainda não sei…

Na cozinha, o garoto abriu e fechou a porta, dessa vez, fazendo barulho. Subiu correndo para o quarto e se jogou na cama. O seu futuro corria risco.

 

 


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