— Deveria ter ido ao encontro de um colega, mas, definitivamente, perdi a hora.
Esse era Nogueira dando o
seu depoimento.
— Às vezes acontece. —
Rafaela tomava nota.
— Mas não posso me dar ao
luxo de furar um encontro com ele.
— Ele é seu namorado?
O olhar de desaprovação foi
suficiente para negar a afirmação, mas ele respondeu:
— Não! É um colega de
trabalho que tem me ajudado com algumas dificuldades…
Não só por fato de ser um
depoimento, mas Rafaela ficou curiosa:
— Ajudá-lo em uma
dificuldade? Poderia esclarecer?
Pouco acanhado Nogueira
respondeu:
— Ele está tentando… — A vergonha aumentou e ele teve dificuldade em continuar.
— Prossiga! — Ela pediu.
— … Está me ajudando a mudar
minha perspectiva para relacionamentos afetivos.
Ela congelou o seu olhar,
fitando o rapaz, e ficou assim por alguns instantes.
— Ele seria como um…
— … Um coach de relacionamento.
Rafaela o olhou novamente,
como se o mensurasse. Arrumou os papéis sobre a mesa e questionou-o mais uma
vez:
— O senhor tem ciência de
que isso é um depoimento, sim ou não?
— Estou falando sério, se é
o que quer saber.
— Desculpe! Confesso que não
escuto isso com frequência. — Respondeu fazendo as últimas anotações.
— Pois é… — Nogueira estava
incomodado com o assunto — …terminamos?
— Claro! Claro! Muito
obrigado pelos esclarecimentos, e… obrigado por ter me ajudado lá no
estacionamento.
— Sempre que precisar. Onde
está o meu carro?
— No depósito. Vamos até lá
que ajudo a liberá-lo.
Saíram pela porta, viraram à
esquerda, desceram dois lances de escada e, após um corredor, chegaram ao
guichê do depósito.
— Bom dia, Rafaela! Ainda
aqui? — E cumprimentou o estranho: — Bom dia!
— Boa dia! — Respondeu, Nogueira
olhando para o relógio.
— Pois é, Fangundes. Acabei
me enrolando com uma das ocorrências. Agora preciso liberar um Comodoro que
está estacionado aí.
— É seu? — se dirigiu ao
rapaz.
— É sim!
— Parabéns! Está em
excelente estado de conservação.
— Obrigado!
E olhou para Rafaela como se
implorasse pela liberação. Ela entendeu:
— Me passa os requerimentos
dele, por favor!
— Claro! Estão aqui. — E
montou, diante deles, as três vias com papel carbono. — É só preencher e
assinar.
Ela fez como o solicitado,
preencheu e devolveu os documentos. Fagundes abriu um claviculário e pegou a
chave, entregando para a policial.
— Obrigada! — E ela entregou
a chave para o rapaz. — Eu o acompanho até a saída.
— Obrigado! Poderia me dizer
onde tem uma lanchonete aberta esse horário?
— Claro! Farei melhor.
Preciso tirar meu intervalo então segue a minha viatura.
Novamente era como se ela
saísse do seu corpo para tentar ver se foi ela mesma que disse isso.
— Ok!
Em minutos estacionavam
diante da Favas Burgueria. Faminto, Nogueira, se conteve para caminhar ao lado
da militar. Frente ao caixa perguntou à ela:
— O que vai querer?
Espantada com a pergunta,
respondeu:
— Frango e bacon.
Nogueira olhou para o lado e
viu um lanche aguardando o cliente. Calculou e fez o pedido:
— Três sanduíches com frango
e bacon, um com calabresa, uma porção de batatas-fritas, e dois sucos de
laranja. O meu com açúcar — e olhou para Rafaela que meneou a cabeça em
confirmação. — Os dois com açúcar.
Enquanto o rapaz pagava o
lanche, lá dentro, o atendente já tinha algumas coisas já prontas. Completou e
entregou na bancada, avisando:
— Em breve entregamos as
batatas.
— Tudo bem. — Nogueira
recebeu a bandeja, a chamou: — Vamos sentar ali.
E caminharam até uma mesa
mais afastada. Em silêncio, Rafaela veio atrás, observando o quanto Nogueira
era alto e tinha ombros largos. Sentaram-se frente à frente e ela pode
assistir, estarrecida, ao rapaz devorar o primeiro sanduiche, talvez em cinco
mordidas.
“Inacreditável!” — Rafaela
pensou permanecendo estática.
Como se lesse o pensamento
da garota, ele perguntou:
— Não vai comer? — E lhe
sorriu.
Quase como uma fera do
campo, Rafaela também devorou o seu sanduiche. Não falou nada antes, mas também
estava faminta. Quando ela começaria um diálogo, seu rádio portátil soou,
avisando de uma ocorrência nas imediações:
— Preciso ir.
Como se voltasse a si, Nogueira
a respondeu:
— Certo! Então até a próxima!
E tenha um bom trabalho.
E Rafaela correu rumo à
porta.
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